"Quero que vá tudo por Inferno" fez tanto sucesso, que além de tocar no carnaval do ano seguinte (1966) serviu de tema para Enéias Tavares Santos escrever em literatura de Cordel a "Carta do Satanás a Roberto Carlos"
Enéias Tavares Santos
Carta do Satanás a Roberto Carlos
(Versão atualizada gramaticalmente pelo blog robertocarlos.vai.la)
Roberto Carlos cantando,
Esse seu disco moderno,
Aonde diz que alguém venha,
Aquecê-lo "neste inverno",
E depois dele aquecido,
"Tudo o mais vá pro inferno".
Há poucos dias, por isso,
Uma carta recebeu.
Que o Satanás lhe mandou,
Com medo do disco seu,
Vamos saber na missiva,
O que foi que ele escreveu:
-"Inferno, côrte das trevas,
Meu grande amigo Roberto,
Eu vi o seu novo disco
É muito bonito, é certo,
Mas cumprindo a sua ordem,
O mundo fica deserto.
Porque você está mandando
Todo o mundo para aqui,
Se esse povo vier todo,
O que é que fica aí ?
Será o maior deserto
Que eu fico vendo daqui.
Homem que bate em mulher
Tem para mais de um milhão,
Mais duzentos mil tarados,
(Entre rapaz e ancião),
Setecentos mil ladrões
Tem num pequeno galpão
E quanto mais você canta
Ainda mais gente vem,
Só de moça depravada
Ontem chegou mil e cem,
Aqui já está de uma forma
Que não cabe mais ninguém.
Você diz que não suporta
Ela longe de você,
Eu que vou suportar
Tanta gente aqui, por que?
Que fique tudo lá mesmo
Cantando o seu ABC.
O sofrer aqui é tanto
Que estou de boca amarga
E breve o meu inferno
Faço uma porta tão larga
Que encho o mundo de diabos
Com a primeira descarga.
Aqui não tem mais lugar
Nem mesmo para um ateu,
O meu enorme fichário
Esta semana se encheu,
Os apêrtos deste inferno
Quem sabe mesmo sou eu.
Já na semana passada,
Chegaram quase um milhão
De motoristas "mão grossa"
Que andam na contramão
Matando o povo na rua,
E ficando sem punição!
Balconista que na loja
Só mede esticando o pano,
No inferno já entraram
Uns quinze mil este ano
E de "play-boy" já chegaram
Doze mil, se não me engano!
De batedor de carteira,
Ninguém pode mais somar,
Ladrão de galinha é tanto
Que não se pode contar
É um por cima do outro
E eu sem jeito para dar
Filhos desobedientes
Que não respeitam seus pais,
Vive tudo amontoado
Dando suspiros e ais,
Com todos os quartos cheios,
Não tem onde botar mais.
E soldados que na feira
Aborrecem o folheteiro
Querendo cobrar imposto,
Lá no porão derradeiro,
Tem tantos que já estão
Exalando até mau cheiro.
Moça que vai para a rua
À noite depois da janta
E volta de madrugada,
No inferno já tem tanta
Que se eu for dizer o número,
Muita gente aí se espanta!
Poeta plagiador,
Também já tem um bocado,
E também dono de venda
Que vende charque molhado,
Aqui dentro do inferno,
Vive tudo amontoado.
Homem de duas mulheres,
Aqui tem com fartura,
Mulher que bebe cachaça,
Depois faz descompostura,
Tem mais de seiscentas mil
Bebendo fel de amargura!
Dono de sorveteria
Que pega um maracujá,
Faz dez litros de refresco
E diz que é o melhor que há,
Já tem uma soma enorme,
Nem mande mais pra cá!
E o açougeuiro que vende
Carne com o semblante duro,
Boa, sem ôsso, ao rico,
Ao pobre vende ôsso puro,
Por não ter mais onde bote,
Estou pondo no monturo.
Vendedor de amendoim
Que agarra um papelão,
Bota no fundo do litro
Para enganar seu irmão,
Tem cem mil pendurados
No derradeiro porão.
Viúva de poucos mêses
Que anda toda pintada
Atrás de arranjar marido
E com saia bem ligada,
Essa eu já estou mandando
Procurar outra morada.
Xangozeiro aqui tem tanto
Que estou quase caduco,
Tem chegado da Bahia,
Guanabara e Pernambuco,
Enfim, do Brasil inteiro,
Eu vou terminar maluco!
De camelô de calçada
Estou com o inferno cheio,
Neste inverno mesmo foi
Tanto camelô que veio
Que não tive onde botar
Passei um grande aperreio!
Pregador ganancioso
Que só prega por dinheiro,
Eu fiz um galpão enorme
Mas encheu muito ligeiro,
E nem eu recebo mais
Cartomente e curandeiro!
Carregador chapeado
Que vive só explorando,
Ourives que vende ferro,
Aos tabaréus enganando,
Quem vende roubando o peso,
Desses eu estou me livrando!
Doutor que não examina
As doenças do cliente
E manda comprar remédio
Sem dizer o que ele sente,
Quando chega aqui cai logo
Num tacho de chumbo quente.
E tantos outros que vêm
Que não posso descrever,
Porque o meu tempo é pouco,
Tenho muito o que fazer
E mesmo aqui no inferno
Não há quem possa escrever.
Porque a zoada é tanta
Que deixa tudo aturdido,
Breve o meu inferno estoura,
Só se ouve o estampido
E eu vou ficar em farrapo
Pelos planetas perdido.
Portanto, amigo Roberto,
Tome em consideração
O pedido que lhe faço
Acabe essa gravação,
Não me mande mais ninguém,
Tenha de mim compaixão !
Mande tudo para o mar,
Que lá cabe muita gente,
Ou para um outro lugar,
Do inferno bem diferente,
Porque vindo para aqui,
Não há satanás que agüente.
Se não gostou do pedido
Aqui não quis lhe agravar,
Tentei apenas fazer
Ao meu amigo chegar
Nesta carta o meu horror
A mais cruciante dor
Se não me crer venha olhar.
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